sábado, 20 de agosto de 2016

REVERENDO T & Os Discípulos Descrentes - Puta B​.​O​.​C​.​A. Santa (2016)...




As impressionantes canções do EP Puta B.O.C.A Santa do grupo Reverendo T & os discípulos descrentes podem ser creditadas como a primeira crônica musical do tempo em que vivemos: do que venho chamando de “estado de excreção” (político, estético, religioso)! Que o rock brasileiro tenha se antecipado a descrever o nosso fim dos tempos (já que a mpb, tão preocupada com seus romantismos e saudosismos, está impossibilitada de investir nessa empreitada...) é uma potente reverberação do trabalho poético do cantor e pesquisador Tony Lopes e das amplas referencias musicais de seu parceiro - nesse inusitado projeto - o músico (e mago do estúdio!) Heitor Dantas. Ambos nos oferecem uma ambiência de extrema radicalidade poética, seja literária ou sonora, inusual em nossa modorrenta cena musical. Evocando a malignidade como estética norteadora do trabalho, as letras de Tony Lopes discorrem sobre o “estado excrecionário”: uma boca que se metamorfoseia em anus, ingerindo e excretando realidades e que “cheia de excrementos e injurias” espera “ pelo fim calada” (Boca Fechada); a “perda de rota” da beleza que, agora “se esconde no abandono/do jardim das flores mortas” (No abandono); no desencanto como condição de continuarmos, pois o que tínhamos de fé agora é a “indecência exposta num altar” (Amém). O desconcerto sonoro de Heitor Dantas nos atinge em desarranjos sucessivos, na alternância de estados, na imprevisibilidade de instrumentos e melodias: do lirismo de uma guitarra “blues” ao solo de um “cello”, do “riff” pesado ao ritmo dos atabaques, das “colagens” sonoras ao tratamento “sinistro” da voz do nosso pastor maldito. Esse EP surpreendente é a ultrassonografia de nossa perda e abandono. Como o parto do desprezível personagem do qual não sabemos a quem pertence “o ventre/que abrigou esse escroto” (Pai & mãe). Não seria essa a descrição de como nos sentimos frente aquilo que chamávamos de “brasil”? Não são as palavras e sons de nossa estupefação? Não será fácil ouvir o Reverendo T em sua pastoral do inferno. O que ele nos diz, em sua missa negra, é que em sua bíblia inversa, no fim estava o verbo cantado...
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